Porque a vida merece ser "degustada"


A carrinha, as aldeias, as crianças...

03-02-2019 22:59

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Num vislumbre da memória, recordei hoje uma das melhores experiências da minha infância: a carrinha da biblioteca itinerante da Fundação Gulbenkian. Recordo a expetativa das chegadas, a magia de olhar para as minúsculas prateleiras e a alegria de ler depressa e de trocar de livros. Hoje, passados tantos anos, sou capaz de valorizar o enormíssimo papel cultural que essa iniciativa teve em Portugal. Na altura, achava imensa piada mas claro que não tinha noção de como Portugal precisava tanto de leitura, de como as pessoas precisavam tanto de ler. As bibliotecas itinerantes foram um dos projetos mais carismáticos e valiosos da Fundação, na medida em que pretenderam promover a leitura pública e a cultura em Portugal. 

Corria o ano de 1958, quando 15 bibliotecas itinerantes iniciaram o seu circuito pelo país, num momento em que a taxa de analfabetismo era alta e o Estado Novo reprimia o que era escutado e lido. Desta forma, independentemente da idade ou profissão, crianças, jovens e adultos podiam aceder a livros, de acordo com os seus gostos pessoais. E foram muitas as pessoas que com elas começaram a ler.

Mas, recentemente a Fundação Calouste Gulbenkian voltou à estrada, em nome do Fundo de Apoio às Populações e à Revitalização das Áreas Afetadas pelos Incêndios, entregando ao Município da Sertã uma carrinha totalmente adaptada aos serviços de biblioteca, que começou a percorrer o concelho já no início de janeiro. A carrinha, devidamente caracterizada, começou a percorrer os cerca de 240 lugares do concelho no início de 2019, levando à população mais isolada do concelho (ou com maiores constrangimentos ao nível da mobilidade) livros e revistas, numa ação de disseminação da cultura muito semelhante da que fizeram as Bibliotecas Itinerantes da Fundação Gulbenkian. Além de biblioteca, a viatura acolhe outras valências, como um serviço de apoio à saúde, um posto móvel do Balcão Único do Município, acesso à internet, fotocópias e serviços disponíveis numa caixa multibanco.

As bibliotecas itinerantes marcaram uma autêntica revolução cultural. Extintas em 2002, devido à criação das bibliotecas públicas, deixaram eterna saudade e, sem dúvida, que por esse país fora, são ainda muitas as pessoas sem acesso à leitura e que esboçariam um sorriso se um dia elas regressassem... à sua aldeia.

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